
Amar homem feio vira inspiração para compor, e cantoras emplacam hits engraçados e crítico
“Arrumei um feio só pra mim. Um feio arrumadinho aqui do meu ladinho”, canta Gaby Amarantos em “Bonito Feio”, faixa do seu álbum recém-lançado “Rock Doido”. Os versos seguintes são: “Ele é feio, sim, o que é que tem? Feio também tem coração e chora. É só chamar que ele vem, pronto pra bater meu charque toda hora”.
Também lançada há pouco pela pagodeira Marvvila, “Nike e Shortinho” é outra canção que cita um cara considerado feio. “Todo mundo me falou. Eu não segui conselho. Pra que fui dar moral pra homem feio? O pior é que ainda se achava o brabão.”
As cantoras não estão sozinhas. Cada vez mais, compositoras brasileiras emplacam hits com letras que falam sobre se apaixonar por homem feio.
A nova onda lírica tem como alvo os homens associados à feiura. As músicas vão desde juras de amor até zombarias.
Gaby Amarantos ao cantar ‘Bonito Feio’ em ‘Rock Doido (O Filme)’
Reprodução/YouTube
Garoto estranho à beça
No ano passado, a funkeira Bibi Babydoll lançou uma faixa que cita um feioso de forma explicitamente erótica.
“Eu não gosto dele, eu só gosto da pegada. Eu dou de quatro para não ter que olhar na cara”, canta ela com a voz risonha e aguda. “Ele é muito feio, mas me come bem demais. Eu sento. Eu quico. De frente? Jamais.”
Funk lançado em 2025 por MC India, “Ele é feio pra KRL” é outra letra com versos sexuais. “Além de um mala, tu é feio pra caralho. Bato siririca, mas não quebro o seu galho”, diz o refrão.
Já a rapper Ebony, assim como Gaby Amarantos, canta sobre uma mulher que vibra por se relacionar com um cara desprovido de beleza. No hit “Pensamentos Intrusivos”, de 2023, ela entoa: “Eu quero um garoto feio pra ser namorado. Um garoto estranho à beça pra andar do lado”.
Ebony no clipe ‘Pensamentos Intrusivos’
Reprodução/YouTube
“O meu tesão aumenta muito se ele for otaku. Um que corre igual Naruto, levantando o braço. Um que minha tia fale ‘vai sumir, tá magro’. Ou um bem grande e forte, L444. Eu não ligo pra aparência, só pra energia.”
O hit “99 Problemas” não é focado na temática, mas também chega a mencionar a imagem do homem feio. “Negra bonita não pode ser fraca. Sei que um dia já sofri por feio, mas fiz enterro desse meu passado pra hoje colher semente, dinheiro”, cantam Duquesa e MC Luanna em um trechinho da faixa, de 2023.
Embora tenha desabrochado em 2023, a onda de mulheres cantando sobre feiura masculina começou a crescer mesmo em 2024. Agora, em 2025, ganha projeção a nível nacional — sobretudo, pelo sucesso de “Rock Doido”.
Pra que dar moral pra homem feio?
Cantar sobre feiura não é novidade. No Brasil, homens já fazem isso há décadas. Por exemplo, um dos maiores hits de Seu Jorge, “Amiga da Minha Mulher” (2011) traz versos como: “Se fosse mulher feia, tava tudo certo. Mulher bonita mexe com meu coração”. Aliás, o cantor tem uma música chamada “Mina Feia” (2015).
“Dona Gigi”, dos Caçadores e DJ Malboro, explodiu de sucesso em 2005. A letra fala de uma mulher “feia, fedorenta e mentirosa” e menciona violência física contra ela.
Há ainda faixas como “Feiosa” (1982), de Almir Guineto, “Melô da Mulher Feia” (1989), de Abdula e DJ Malboro, e “As Bonitas que me Perdoem, mas a Feiura é de Lascar” (1994), do Falcão — o título dessa brinca com uma frase de Vinicius de Moraes (“as feias que me perdoem, mas beleza é fundamental”).
O cantor Falcão
Divulgação
Agora, pela primeira vez, mulheres conseguem emplacar grandes sucessos com lírica sobre feiura — sobretudo, masculina.
Feio também tem coração
Claro, as noções de beleza e feiura são subjetivas, mas também são construídas culturalmente a partir de padrões estéticos firmados no nosso imaginário. Em geral, as letras dessa onda não descrevem os traços físicos do personagem. Apenas aguçam a imaginação com versos engraçados.
Além disso, muitas letras defendem a ideia de que o amor é cego e, em vez de exaltar a beleza, exaltam virtudes como companheirismo, conexão sexual e demonstrações de carinho.
Músicas como “Bonito Feio” e “Pensamentos Intrusivos” funcionam ainda como crítica à masculinidade egocentrada, ao debochar de galãs apáticos.
“Me cansei de só comer o pão que o diabo amassou, na mão desses padrão”, canta Gaby no hit. “Ele é meu sereio, meu bonito feio. Que bom que cê veio pra me tirar da solidão.” É como se homens feios dessem mais importância à parceira do que os belos.
Já em casos como os hits “Nike e Shortinho” e “99 Problemas”, a imagem de caras feios surge como forma de a mulher reafirmar sua própria autoestima. É meio xingamento por raiva do ex.
Tudo isso indica que cada vez mais espaços se abrem às compositoras e, além disso, que o público está cada vez mais aberto a essas líricas.
Pelo menos no fone de ouvido, ser homem feio está na moda.
Fonte: g1 > Pop & Arte
