
Diretora e funcionárias de creche respondem na Justiça por suspeita de maus-tratos
A Justiça do Rio de Janeiro condenou a diretora e 2 funcionárias da Creche-Escola Tempo de Construir, em Ramos, Zona Norte do Rio de Janeiro, por maus-tratos qualificado e continuado contra uma criança de 3 anos com paralisia cerebral. As agressões ocorreram em setembro de 2021 e foram registradas por câmeras de segurança da unidade (relembre acima).
O caso veio a público após a mãe do menino, a policial militar Flávia Louzada, levar o material à polícia. As imagens mostravam o filho, Dante, preso por horas a uma cadeira adaptada, sem acesso a água, alimentação adequada ou interação com outras crianças. O episódio gerou comoção e levou à abertura de um inquérito pela 21ª DP (Bonsucesso).
A sentença, assinada nesta segunda-feira (10) pelo juiz Paulo Roberto Sampaio Jangutta, da 41ª Vara Criminal da Capital, condenou Danieli Alves Baptista Boniel, diretora e proprietária da creche, Samantha Carla Alves Cavalcanti e Vitória Barros da Silva Rosa, professoras do menino, às penas de 3 anos e 7 meses e 3 anos e 1 mês de reclusão, respectivamente, todas em regime inicial aberto. As penas foram substituídas por prestação de serviços à comunidade.
“As agressões foram gravadas, investigadas e levadas a julgamento. Hoje, a Justiça confirmou o que as imagens já mostravam. Não é boato, é sentença. Meu filho, Dante, foi vítima de maus-tratos na creche onde deveria estar seguro, e agora as responsáveis foram condenadas”, disse Flávia.
“Elas deixam de ser rés primárias e passam a carregar o título que elas mesmas escolheram: condenadas por maus-tratos qualificado e continuado.”
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Dante em imagens fornecidas pela direção da escola: criança feliz e que participava das atividades
Arquivo pessoal
Entendimento do juiz
Na decisão, o magistrado afirmou que as acusadas “privaram a criança de alimentação e cuidados essenciais, revelando grave omissão no exercício do dever de guarda”.
Segundo ele, embora as rés não tenham agido com a intenção deliberada de impor sofrimento, houve negligência grave e continuada:
“Os elementos probatórios indicam que não houve intenção deliberada de impor sofrimento atroz à vítima. O que se verifica é uma grave omissão por parte das acusadas no cumprimento de seus deveres de cuidado, vigilância e proteção.”
As provas mostraram que Dante foi mantido sentado por longos períodos — em um dos dias, por mais de 5 horas seguidas —, sem acesso a líquidos nem interação com outras crianças.
“A permanência por longos tempos na cadeira de apoio pela vítima, conforme se observa do laudo de perícia criminal, resultou em maior irritabilidade e regresso no processo de desenvolvimento da vítima”, escreveu o juiz.
Jangutta também rejeitou o argumento de que as funcionárias desconheciam a gravidade da conduta.
“A prática de manter uma criança amarrada a uma cadeira por horas, sem acesso a água ou interação, ofende o senso comum e o sentimento de justiça de qualquer pessoa. Trata-se de uma conduta tão evidentemente cruel e desumana que é impossível alegar desconhecimento de sua ilicitude.”
Responsabilidade da diretora
O juiz destacou o papel da diretora Danieli Boniel ao afastar a mediadora que acompanhava Dante nas atividades e orientar as professoras a mantê-lo na cadeira.
“A conduta de Danieli de retirar a mediadora exclusiva de Dante, deixando a criança apenas com os cuidados de Samantha e de Vitória, orientando-as, inclusive, a deixá-la na cadeira de apoio fornecida pelos genitores da vítima, caracteriza o crime de maus-tratos.”
Relembre o caso
O g1 revelou em 2022 que Dante, então com 3 anos, foi mantido por horas em uma cadeira adaptada, sem oferta de água, higiene ou interação com os colegas. Segundo a denúncia do Ministério Público, a criança chegou a desenvolver infecção urinária por falta de hidratação.
À época, a diretora e as funcionárias negaram as acusações e disseram que a cadeira era usada por orientação dos pais, como forma de garantir segurança ao menino. A defesa também alegou que não houve maus-tratos e que o caso fazia parte de uma “campanha difamatória”.
O Ministério Público denunciou as 3 mulheres em 2022. Após o recebimento da denúncia e realização de audiência de instrução, o juiz concluiu que as provas — incluindo vídeos, laudos periciais e depoimentos — comprovam a autoria e a materialidade do crime.
“Não restam dúvidas acerca do atuar delitivo das acusadas, no sentido de praticarem maus-tratos contra uma criança de três anos de idade à época dos fatos. Houve exposição a perigo da saúde de Dante, pessoa que estava sob autoridade das acusadas Danieli, Samantha e Vitória, privando-a de alimentação e cuidados indispensáveis”, afirmou o magistrado.
As condenações ainda são passíveis de recurso. O g1 tenta contato com a defesa das rés.
Fonte: g1
