
Prefeitura quer retirar famílias de área de risco em Rio Branco; moradores dizem ser contra
Um plano da prefeitura de Rio Branco para retirar famílias do bairro Dom Giocondo, conhecido como Papoco, está causando impasse na capital. É que o executivo municipal apresentou um relatório ao Ministério Público do Acre (MP-AC) que cita a necessidade de transferência dos moradores por conta do risco de deslizamento de terra no local.
Além disso, a Secretaria Municipal de Assistência Social e Direitos Humanos (Sasdh) juntou um documento com assinaturas no qual os residentes, supostamente, concordam com a saída do local. Contudo, segundo alguns moradores, eles foram induzidos a pensar que a documentação seria para garantir benefícios sociais, e que não querem sair do local.
📲 Participe do canal do g1 AC no WhatsApp
“Veio a equipe da Sasdh fazer um recadastramento e como é a secretária dos Direitos Humanos, na cabeça da população, são benefícios que vão chegar para a comunidade, então, todo mundo fez o recadastramento e fomos pegos de surpresa com a fala do secretário nas suas redes sociais da remoção”, relata Eduardo Freitas, que diz morar há 40 anos no Papoco.
A Rede Amazônica Acre foi até a comunidade e soube dos moradores que, na verdade, eles não desejam sair dali. A principal preocupação é com o impacto de uma possível mudança na organização que as famílias já têm atualmente.
LEIA MAIS
MP instaura procedimento para avaliar políticas públicas em bairro localizado em área de risco na capital
Em Rio Branco, mutirão de limpeza no bairro Papoco deve retirar 20 toneladas de lixo
‘Terra Prometida’: mais de 100 casas foram demolidas em operação de reintegração de posse em área invadida
“A questão não é só uma casa, a questão é nossa vida. É daqui que a gente tira o nosso ganho para a nossa família. Se a gente for lá para o outro lado, como é que a gente vai manter o ônibus, Uber, como que a gente vai chegar dez horas da noite na faculdade?”, questionou Gleiciane de Oliveira, que é cabeleireira.
Prefeitura alega que comunidade fica em área com risco de deslizamentos de terra
Reprodução/Rede Amazônica Acre
Mudança em até 90 dias
Comunidade Papoco, às margens do Rio Acre, em Rio Branco
Reprodução/Rede Amazônica Acre
Entretanto, a prefeitura segue com o plano e prevê que a transferência ocorra em até 90 dias. Em entrevista exibida no dia 20 de outubro, o secretário João Marcos Luz afirmou que a maioria dos moradores queria sair da região.
“95% das famílias disseram ‘sim’, elas querem sair, elas não aguentam mais viver naquelas condições, só 5% não querem sair. Eu tenho certeza, eu tenho convicção que, com o apoio do Ministério Público, do Tribunal de Justiça, das instituições, nós vamos convencer esses 5% a sair de lá e ir para um lugar digno”, afirmou.
Questionado sobre a alegação dos moradores de que foram induzidos a assinar o documento e que não concordam com a remoção, Luz apenas reafirmou que 95% das famílias são favoráveis à retirada.
“Somente quatro famílias disseram que não querem sair. E são esses que estão, agora, fazendo confusão. Mas nós vamos vencer e gerenciar todas as crises que aparecerem. Esse debate vai ser com muita transparência”, completo.
Enquanto isso, as famílias seguem no centro do impasse e na esperança de serem ouvidos.
“Com essa notícia dessa saída da gente daqui, eu tô apreensiva, eu só quero ficar na minha casa e ter o meu trabalho honestamente, só isso”, declarou a técnica óptica Maria Souza.
Apuração
Ainda em outubro, o MP-AC visitou a região. O órgão expediu duas recomendações relacionadas ao tema, em julho e outubro. A primeira orienta a recuperação ou destinação adequada da escola, o levantamento das famílias em áreas de risco, a escuta da comunidade e a implementação de serviços públicos essenciais, como iluminação e asfaltamento.
A segunda determina que não sejam realizadas remoções forçadas sem comunicação prévia, garantindo reassentamento em condições adequadas e participação efetiva das famílias.
Em junho, um procedimento administrativo foi instaurado pelo MP para fiscalizar e apurar as políticas sociais públicas desenvolvidas no Papoco. A solicitação cita que a principal observação é relacionada às ações que cuidam da prevenção do uso de drogas, bem como ausência de moradia adequadas e seguras.
À época, o g1 entrou em contato com a prefeitura de Rio Branco, que rege os órgãos municipais citados nesta reportagem, e aguarda retorno.
A solicitação, feita pelo promotor de justiça de Defesa dos Direitos Humanos e Cidadania, Thalles Ferreira Costa, foi publicada no Diário Oficial Eletrônico do MP-AC e, destacou que as solicitações se deram, por conta da ausência do município na gestão daquele local, ‘que passa por infinitas mazelas sociais e agravam a pobreza e ferem a dignidade das pessoas’.
“É indispensável a formulação de políticas sociais públicas e identificar quais os serviços públicos que deveriam ser implementados ou reestruturados para o atendimento das necessidades vitais básicas daquela região”, afirmou o promotor.
VÍDEOS: g1
Fonte: g1
